“Em cada amor se nasce e se morre. Por isso é que, para haver a vida, há de haver a morte. Uma morte tênue que pulsa sempre onde nasce o amor.”
No dia em que completariam dez anos e dois meses de namoro, ela finalmente se deu conta de que tudo tinha acabado.
- Estou curada – pensou.
(nunca tinha pensado nesse ponto de vista).
Notou que ele, já havia ido embora, desde o sétimo aniversário e nem tinha dado conta que comemorara sozinha os três últimos anos quando, atônita, tomava seu primeiro banho de mulher solteira.
Mirou-se no espelho como a muito não fazia.
Sentia um amor próprio, quase narcisista e, admirava com palidez suas rugas e seus cabelos brancos.
A beleza do tempo, naquele dia dezoito.
Amou dezoito mil vezes,
durante cento e vinte e dois meses,
três mil setecentos e onze dias,
dez horas e,
trinta minutos.
Sentiu frio.
A frieza do tempo naquele dia dezoito.
No fundo da pupila refletida, um esboço de amor transformado.
Sorriu, sem a graça da paixão, mas com o brilho de um amor infindo!
Um amor passado e só agora, realmente eternizado no se viveu.
Tateou os azulejos do banheiro até o espelho. Tocou seu próprio rosto. Observou-se só: seu tato, suas mãos, sua escova de dentes. Seu mundo a sua volta crescia, revelando-lhe seu quarto, sua casa, sua vida.
Deitou-se, respirando seu cheiro, da cama à sua própria pele.
Reconhecera-se.
Reencontrou a si e sentiu o sono esquecido antes dos remédios para dormir.
E lembrou-se de como era bom dormir devagar, sem sentir que o sono vem abraçando mansinho... Como o sonhar-longo depois de ler um livro com os olhos secos e o coração em paz.
Podia ter certeza de que, sorrira, de vez em quando, durante o sono, feito um recém-nascido “sonhando com os anjos”.
Acordara sem lhe cair uma lágrima dos olhos, ao contrário, as cintilantes pupilas dilatavam-se as novas cores trazidas por sua primeira manhã!
Renascida, tomava seu café, como se houvera sempre sido metade.
E entendendo-se parte amputada, fortalecia-se de sua completa capacidade para tudo.
Sentiu-se inteira enxergando o motivo, intuindo o sentido de permanecer vi-va, naquele dia dezoito.
Mas, dia dezoito já não era,
Nem ela aquela que houvera
Quando provava a espera
De antigos dias dezoito.